A Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), que representa mais de dez mil proprietários urbanos à escala nacional, volta a apresentar ao Governo e a todos os grupos parlamentares um pacote de medidas transversais de alívio e benefícios fiscais sobre a propriedade imobiliária a inscrever no Orçamento de Estado de 2019 (OE 2019), em sede de IRS, IMI e AIMI, reclamando tréguas à ofensiva lançada sobre os proprietários e sobre a propriedade imobiliária que está na base da crise na habitação que se vive no país.
Os proprietários portugueses são parte da solução e não do problema que está criado. A situação de emergência que se vive tanto na habitação como no arrendamento não pode excluir e hostilizar os donos dos imóveis que, para mais, há décadas assumem a função social do Estado que lhes foi imposta.
A ALP deixa por isso o repto para que haja coragem política para inscrever no OE 2019 o pacote de medidas abaixo elencado e que seja consignada em sede do Orçamento uma dotação para apoios sociais, nomeadamente cumprindo o Decreto-Lei 156/2015, que está em vigor, e que prevê a atribuição de um subsídio do Estado a conceder a inquilinos com comprovada carência económica, e uma verba significativa para construção e requalificação do edificado público para habitação social, por forma a estancar a crise e bolha da habitação no país. A aplicação deste diploma permitiria evitar que o ónus da carência económica dos arrendatários continue a ser injustificadamente transferido para os senhorios.
A ALP tem vindo incessantemente a alertar de forma pública que o desvario da ofensiva do Governo e das forças que o suportam sobre os proprietários de imóveis, quer através de uma catadupa de propostas de lei desarticuladas no âmbito da habitação, arrendamento e alojamento local – todas elas assentes na defesa dos direitos dos inquilinos à custa da supressão dos direitos dos proprietários –, quer através do garrote fiscal – com a introdução de novos e injustos impostos sobre a propriedade –, iria criar uma crise sem precedentes na habitação em Portugal.
As palavras “habitação”, “arrendamento” e “rendas acessíveis” estão constantemente nos discursos e intervenções públicas e políticas do Governo e dos seus parceiros. Porém, passados oito meses de vigência do Orçamento do Estado de 2018, e quatro meses depois de ter anunciado com grande pompa e circunstância a sua “Nova Geração de Políticas de Habitação”, que se pretendia uma reforma corajosa e com ambição, há zero medidas em vigor para reverter a desastrosa política levada a cabo nos últimos três anos que levou à presente situação de emergência na habitação.
Com efeito, a única de todas as medidas anunciadas que entrou em vigor, passados vários meses, foi a transformação forçada de contratos com a duração de cinco anos em contratos vitalícios, uma vez mais, contratos esses que tinham sido firmados livremente e de boa-fé entre senhorios e inquilinos, a partir de 1990, no âmbito do RAU, para os inquilinos que tenham hoje mais de 65 anos ou mais de 60% de incapacidade — medida que a ALP reputa de inconstitucional, tendo já solicitado à Provedora de Justiça a sua fiscalização — e a suspensão arbitrária dos despejos até Março de 2019.
A previsão feita o ano passado pela ALP, aquando do envio do seu caderno reivindicativo ao Governo e ao Ministério das Finanças – que foi liminarmente ignorado por ambos –, cumpriu-se: existe uma escalada insustentável dos preços da habitação, o mercado de arrendamento em Portugal está a colapsar, e a confiança dos proprietários nas instituições e no Estado de Direito está ferida de morte. O diagnóstico da ALP é também partilhado por Bruxelas que, ontem, na oitava avaliação ao pós-programa de resgate de Portugal, refere que as “ineficiências” geradas pelo “quadro regulatório” em matéria de habitação estão a contribuir para um clima de crispação social entre senhorios e inquilinos, e que paira o risco de haver cada vez menos casas para arrendar, porque alguns proprietários sentem que a lei está a favorecer mais os inquilinos.
Este é o momento de repensar a linha política do Governo e dar tréguas à ofensiva sem precedentes que foi lançada sem qualquer justificação contra os proprietários, para a qual a ALP está disponível para contribuir construtivamente.
Os proprietários portugueses ambicionam que a proposta de OE a apresentar brevemente pelo Governo ao Parlamento inclua o seguinte pacote de medidas:
IRS – Imposto sobre Rendimentos Singulares
A ALP considera que o escalonamento das taxas liberatórias de IRS para rendimentos prediais inscrito na “Nova Geração de Políticas de Habitação”, que prevê uma redução da taxa liberatória de IRS dos rendimentos prediais dos actuais 28% para os 14% nos contratos de duração superior a 10 anos, e de 10% no caso dos contratos com vigência de 20 anos, está destinada ao fracasso.
Trata-se de uma medida irrealista, que não vai ter qualquer acolhimento por parte dos proprietários, pois a maioria dos senhorios deixou de fazer contratos superiores a um ano – situação imputada à falta de confiança que depositam no Estado democrático e na estabilidade legislativa no âmbito das leis do arrendamento.
Por experiência própria, os proprietários sabem não poder acreditar que estas medidas vigorem durante o período de duas décadas, ao qual estarão amarrados a um contrato de arrendamento, quando está demonstrado que qualquer Governo pode fazer tábua-rasa das reformas estruturantes que estavam em curso, e tornar, por exemplo, esses contratos a prazo, celebrados de boa-fé e à luz da Lei, em arrendamentos vitalícios.
Relativamente ao anúncio da isenção de IRS e IMI para os rendimentos prediais dos imóveis colocados no mercado de arrendamento acessível no prazo mínimo de três anos (ou 9 meses no caso de arrendamento de estudantes), que prevê que a renda praticada seja em média 20% mais baixa que a mediana do mercado, calculada pelo INE, prevê a ALP que esta também não tenha acolhimento expressivo, pois ao optar por esse regime, os proprietários terão ganhos marginais, ou mesmo perdas, tendo em conta que o indicador utilizado para a definição da renda acessível é a mediana e não a média do mercado – que pode chegar a ser 10 pontos abaixo da média — transformando a perda dos senhorios em 30% e não em 20%, insuficiente para ter qualquer ganho no IRS. A medida acaba por ser por isso apenas um subsídio dado aos inquilinos.
Neste contexto, a ALP propõe ao Governo, como sinal de boa-fé negocial, uma redução progressiva da taxa liberatória dos rendimentos prediais (actualmente fixada em 28%) em três pontos percentuais por cada ano da vigência de um contrato de arrendamento.
Trata-se de uma redução escalonada que representaria uma diminuição de três pontos percentuais nos contratos com duração de um ano (o que resultaria numa taxa liberatória de 25%); de 6 pontos percentuais nos contratos de dois anos (taxa de 22%); e assim sucessivamente até uma redução da taxa liberatória em 15 pontos percentuais nos contratos de arrendamento com a duração de cinco anos (o que resultaria numa taxa liberatória de 13%). Defende também a ALP uma taxa liberatória única de 10% para todos os contratos de arrendamento celebrados com o prazo superior a 6 anos.
Acredita a ALP que a implementação desta medida de discriminação fiscal positiva levaria muitos proprietários a recuperar a confiança no mercado de arrendamento tradicional.
A persistir na implementação das políticas de estímulo ao arrendamento inscritas na “Nova Geração de Políticas de Habitação” – que, reforce-se, a ALP considera estarem fadadas ao insucesso –, a ALP reivindica que todos os contratos de arrendamento com rendas congeladas, e todos os contratos que eram a prazo, renováveis, e que foram forçados a transformar-se em contratos vitalícios, por via da promulgação de uma Lei que reputa de inconstitucional, venham a ter isenção total de IRS e IMI, por forma a compensar a escandalosa transferência da função social que é do Estado para os proprietários privados.
Ainda no âmbito do estímulo ao arrendamento tradicional, a ALP defende também o abatimento total do IMI e das Taxas Municipais que incidem sobre os imóveis arrendados, em sede de dedução à colecta (e não como agora, em que estes impostos são considerados como uma mera despesa).
Propõe a ALP, no âmbito do seu contributo para o OE 2019, que os sujeitos passivos com rendimentos prediais de imóveis possam deduzir, em sede de IRS, um alargado conjunto de despesas que são fundamentais para a colocação de um imóvel no mercado de arrendamento, nomeadamente as despesas realizadas na aquisição de móveis de cozinha e electrodomésticos, que estão excluídos por parte do Fisco.
O pacote de reivindicações da ALP para o OE 2019 propõe idêntica dedução em sede de IRS nas despesas efectuadas para aquisição de mobiliário, no caso de imóveis equipados e mobilados colocados no mercado de arrendamento tradicional.
Repare-se que é absolutamente impensável colocar uma casa no mercado de arrendamento sem que esta disponha de armários na cozinha (cuja montagem não pode ser deixada à responsabilidade dos inquilinos, sob pena do perigo de ocorrência de danos nas canalizações de água e gás), ou sem fogão, forno e esquentador (cuja instalação tem de ser feita por técnicos credenciados), frigorífico e máquinas de lavar, entre outros. Quando não se permite aos senhorios a dedução destas despesas, está-se a aumentar artificialmente o valor de renda cobrada, já que os proprietários terão de repercutir o valor do IRS sobre o custo dos equipamentos, prejudicando assim, em última análise, os próprios arrendatários.
Defende também a ALP que os juros e amortizações com empréstimos para obras de recuperação de imóveis colocados no arrendamento possam ser deduzidos no âmbito do IRS, estimulando a reabilitação urbana e o aumento das condições do parque habitacional do país, profundamente degradado por mais de um século de congelamento das rendas. É imprescindível ainda que as despesas com obras e reabilitação urbana de imóveis colocados posteriormente no mercado de arrendamento possam ser deduzidas ao longo de vários anos fiscais. A ALP alerta, ainda, para o impacto extremamente negativo que as alterações efectuadas na Lei das Rendas terá nas operações de reabilitação urbana, ao impossibilitar o despejo por motivo de obras profundas.
IMI – Imposto Municipal sobre Imóveis
No pacote de exigências dos proprietários no âmbito do OE 2019, a ALP exige um alívio fiscal do “garrote” do IMI, defendendo a fixação de uma taxa única de 0,1%, a aplicar em todo o país, uma medida que colocaria um ponto final à discricionariedade praticada pelos distintos municípios, e que deixaria de penalizar os proprietários dos municípios endividados, que têm obrigatoriedade de aplicar a taxa máxima, actualmente fixada em 0,45%.
Trata-se também de uma medida que aliviaria a asfixia fiscal que atinge anualmente milhões de proprietários. Recorde-se que 75% dos portugueses são proprietários da sua habitação própria permanente, e que, em 2017, os impostos directamente cobrados sobre o património e transacções imobiliárias atingiram 2.440 milhões de euros brutos. Este é o valor mais alto desde pelo menos 2005 e representa um crescimento de 14% face ao montante arrecadado no ano anterior.
Ainda no âmbito da batalha contra a discricionariedade que é praticada pelos municípios em sede de IMI, a ALP reivindica uma redução automática em 30% do valor a pagar por este imposto, no caso de imóveis arrendados. Tratar-se-ia de uma alteração ao Código do IMI de forma a constituir a possibilidade de redução até 30% da taxa, bem como tornar o mecanismo automático sem necessidade da instrução de qualquer processo, uma vez que apenas algumas câmaras do país o aplicam (por exemplo Lisboa, com o máximo de 20%), e que milhares de proprietários desconhecem, ou não sabem como instruir. Esta medida fomentaria a colocação de imóveis no mercado de arrendamento tradicional.
Ainda no domínio do IMI, a ALP defende um alargamento da aplicação do Regime Especial de Apuramento do IMI a todos os proprietários que terão que suportar o regresso ao congelamento das rendas e aos contratos vitalícios.
O Regime Especial de IMI foi instituído em 2011 como um travão ao aumento do IMI no caso dos contratos antigos das rendas congeladas ou, posteriormente, com a entrada em vigor do Novo Regime de Arrendamento Urbano (NRAU), no caso das rendas fixadas em função da carência económica comprovada pelo inquilino (rendimento anual bruto corrigido até cinco salários mínimos nacionais).
Este mecanismo prevê que o cálculo para incidência do imposto a pagar não possa ultrapassar o montante que resultar da renda anual multiplicada por 15, independentemente do valor patrimonial tributário fixado para o imóvel.
Acontece que a Administração Tributária (AT) impôs requisitos desproporcionados de acesso a este benefício fiscal, e implementou um labirinto de formalismos burocráticos cada vez mais difíceis de cumprir, que impediu milhares de senhorios de aceder a este regime de protecção — bastando por exemplo a não instrução do processo num único ano para estes se verem impossibilitados para todo o sempre de terem direito a ele. A ALP reivindica, por isso, a reposição da fixação do IMI com base na capitalização da renda, com a abolição dos múltiplos entraves burocráticos que foram colocados a esta possibilidade, quando poderia perfeitamente ter aplicação automática.
Adicional ao IMI (AIMI)
Ainda num plano fiscal macro, a ALP exige a imediata extinção do Adicional ao IMI.
Revogar o AIMI – ou “Imposto Mortágua” – no OE 2019 é uma medida que repõe a justiça fiscal e a normalidade no mercado imobiliário, numa altura em que prossegue uma escalada sem precedentes dos preços da habitação. O principal responsável é este imposto, que incide exclusivamente sobre prédios para habitação, distorcendo por isso brutalmente o mercado em prejuízo da habitação.
Efectivamente, este imposto que provocou um furacão de instabilidade junto de proprietários, que se repercutiu instantaneamente na escalada dos preços, foi displicentemente desenhado. Dos 211.690 proprietários que, pelas contas do Governo, deveriam estar sujeitos a este confisco – que só incidiu sobre imóveis de habitação –, apenas um terço (ou 62.115) foram efectivamente tributados, garantindo uma receita de cerca de 50 milhões de euros face aos 130 milhões orçamentados. Os danos causados ao mercado imobiliário e à confiança de proprietários e investidores foram seguramente superiores a este encaixe fiscal.
Recorde-se ainda que recentemente se soube que há bancos que estão a cobrar AIMI aos clientes de leasing imobiliário que usufruem de imóveis de valor patrimonial inferior a 600 mil euros, o montante a partir do qual este imposto é aplicado, pelo simples facto de o património dos bancos que se dedicam a essa operação ser naturalmente superior a esse montante. Entre eles estão a Caixa Geral de Depósitos (CGD), o Banco do Estado. Tal só demonstra as absurdas distorções que este imposto causou ao mercado pelo qual o Governo e a deputada Mariana Mortágua são os únicos responsáveis.
Subsídio de renda e investimento do Estado em Habitação Social
A ALP deixa ainda o repto para que haja coragem política para inscrever no OE 2019 uma dotação para apoios sociais, nomeadamente cumprindo a Lei 156/2015, que está em vigor, e que prevê a atribuição de um subsídio do Estado a conceder a inquilinos com comprovada carência económica, e uma verba significativa para construção e requalificação do edificado público para habitação social.
É ao Estado que cabe a função social da Habitação. Os Proprietários estão disponíveis para dar o seu contributo para estancar a crise e bolha da habitação no país, mas não devem ser estes, que já foram forçados por um século de congelamento de rendas a suportar essa função.
É altura de o Governo implementar efectivamente uma “Nova Geração de Políticas de Habitação”. O Orçamento do Estado é o momento de excelência para o Governo, as forças que o suportam, a titular da pasta da Habitação e o Ministério das Finanças darem um sinal inequívoco da sua vontade de mudar o paradigma que falhou.
A Direcção da ALP.