ALP
ASSOCIAÇÃO
LISBONENSE
DE PROPRIETÁRIOS
OE 2023: Proprietários exigem “rendimento mínimo de existência”, com isenção integral de impostos

 

Lisboa 17 de outubro de 2022 – A ALP – Associação Lisbonense de Proprietários, entidade centenária que representa mais de dez mil proprietários urbanos à escala nacional, apresenta ao Governo e a todos os partidos com assento parlamentar um vasto pacote de medidas a inscrever no Orçamento de Estado de 2023 (OE 2023), em sede de IRS, IMI,  AIMI, IMT e Imposto de Selo,  anexando também outras medidas que, no seu entender, são da maior importância para estabilizar e relançar o mercado de habitação em Portugal e salvar o arrendamento.

O pacote de 17 propostas apresentado pela ALP tem como objectivo promover uma maior justiça fiscal na tributação sobre os rendimentos, e a garantia de que existe uma efectiva “neutralidade fiscal” na sequência das limitações impostas pelo Governo no âmbito do arrendamento, em sede das actualizações das rendas em 2023 e do prolongamento indefinido do congelamento de rendas.

A ALP acredita firmemente que a reversão da crise da habitação passa inquestionavelmente pela reposição da confiança dos proprietários no Estado de Direito e nas instituições democráticas, sendo por isso necessário inverter a estratégia política e fiscal até agora seguida.

Este é um contributo que a ALP entrega anualmente para discussão, partindo de uma cuidadosa análise das estatísticas oficiais – quer da AT (Autoridade Tributária), quer do INE (Instituto Nacional de Estatística) e dos dados do universo da ALP, que é a maior associação de proprietários do país.

As propostas reflectem o profundo conhecimento que a associação tem sobre a real situação dos proprietários urbanos portugueses, por um lado, e das disfuncionalidades estruturais da habitação em Portugal, que sucessivos governos entenderam perpetuar e agudizar.

Em primeiro lugar, os proprietários portugueses ambicionam que a proposta de OE 2023, no que concerne à fiscalidade sobre o património imobiliário, possa reverter de imediato o impacto perverso que causou a imposição de um tecto de 2% à actualização anual das rendas em 2023, face aos 5,43% de inflação apurada pelo INE em Agosto.

Impõe-se, também, uma correcção urgente da injustiça do tratamento fiscal aplicado aos proprietários com muito baixos rendimentos e àqueles que suportam, por imposição do Estado, interminavelmente, contratos de arrendamento com rendas congeladas, de valores irrisórios.

Em relação à actualização das rendas para 2023, importa recordar, como enquadramento, que a imposição de um tecto máximo de aumentos foi um expediente administrativo que o Governo aplicou em apenas dois mercados – no mercado de arrendamento e no mercado de gás de botija.

Ao optar por esta via, o Governo obliterou contratos que foram firmados de mútuo acordo entre as partes e nos termos do disposto no Código Civil, passando uma vez mais a ideia de que as “regras do jogo” podem ser mudadas a qualquer instante. Por outro lado, repetiu a fórmula conhecida há muitas décadas, de se eximir a qualquer responsabilidade social perante os inquilinos que comprovadamente terão dificuldade em suportar o impacto da inflação na actualização da renda em 2023, transferindo-a sem hesitações e em singelo para os proprietários de imóveis.

A opção política recaiu na decisão de empobrecer deliberadamente os senhorios, obrigando-os a proporcionar um bónus de liquidez cego a todos os inquilinos em 2023 e anos subsequentes, independentemente de se apurar se estes têm ou não qualquer carência económica. Esta é uma decisão incompreensível para a ALP.

Por comparação, o Governo não actuou junto da banca, no que diz respeito ao crédito à habitação, que incide sobre a esmagadora maioria do mercado de habitação, cujos valores das prestações mensais aumentaram já até 40%, esmagando as famílias, limitando-se a agir há apenas alguns dias, possibilitando uma extensão do prazo do contrato e a suspensão das comissões de amortização antecipada.

Como seria de esperar — por todos, menos pelo Governo —, esta intervenção administrativa do Estado provocou um “terramoto social”. Do lado dos proprietários, foi ceifada uma centelha de esperança que residia neste novo ciclo político, de maioria absoluta, livre das amarras de preconceitos ideológicos contra a propriedade.

Como consequência, a medida provocou uma imediata retracção na oferta de novas habitações para arrendamento, agravando os preços dos novos arrendamentos, e empurrando os proprietários para contratos de curta duração, por forma a diminuir o risco político e fiscal associado ao arrendamento. Prejudicados ficaram também os mais jovens (como os estudantes universitários, ou recém-licenciados) e as famílias de classe média, que não encontram soluções de habitação de arrendamento de média duração, a preços ajustados, sobretudo nos grandes centros urbanos.

Estas são as consequências mais visíveis de uma medida populista mas pouco sensata, que constitui, na prática, um congelamento de rendas igual ao que se perpetua há mais de um século e que perdurará, por decisão deste Governo, em sede do OE2022, até ao final de 2023: menos casas disponíveis, casas mais caras para aqueles que não têm habitação.

Para reverter esta hecatombe, a ALP sugere as seguintes medidas de compensação fiscal e estímulo ao arrendamento:

 

  1. Medidas no âmbito do IRS – Imposto de Rendimento sobre Pessoas Singulares

– “Rendimento mínimo de existência” garantindo isenção integral de IRS a todos os proprietários com baixos rendimentos

 

A ALP propõe a correcção de uma grosseira inconstitucionalidade que afecta há muito os proprietários que têm baixos rendimentos, os quais não são tratados com justiça e equidade fiscal.

 

Propõe-se a criação de um “rendimento mínimo de existência” para todos os proprietários que aufiram pelo seu património muito baixos rendimentos prediais, à semelhança do que já acontece noutro tipo de rendimentos, como os do trabalho dependente e independente (este último, com excepções) e das pensões.

 

O que se pretende com a instituição de um “mínimo de existência” em sede de IRS é a garantia de que todos os contribuintes têm à sua disposição um rendimento sobre o qual não incide imposto, e que pode ser utilizado para assegurar um nível mínimo de subsistência familiar.

O “mínimo de existência de IRS” está previsto no artigo 70.º do Código do IRS, e envolve o limite apurado pela fórmula: 1,5 x 14 x IAS (Indexante de Apoios Sociais). Em 2022, o “mínimo de existência” fixou-se em €9870.

A isenção de qualquer pagamento de IRS aos proprietários de imóveis arrendados que aufiram rendimentos prediais até esse valor corrige uma inconstitucionalidade grosseira (violação do Princípio da igualdade e da Uniformidade, em que a repartição dos impostos obedece a um critério igual para todos os cidadãos). E mais: compensa os proprietários de imóveis por uma função social que o Estado não garante.

Para que se entenda o impacto desta medida, a ALP recorre a um caso concreto de um senhorio que tem como único rendimento de subsistência uma renda de um apartamento de uma assoalhada, no valor de €6.600 anuais. Este proprietário terá de suportar uma factura fiscal em sede de IRS de €1.848 (optando pela tributação autónoma de 28%), ou de €957, no caso de optar pelo englobamento de rendimentos em sede de IRS. Os proprietários são tributados como tendo rendimentos altos mesmo quando estão muito abaixo dos valores fixados pela fórmula do “rendimento mínimo de existência” e deveriam, por isso, estar isentos de qualquer tributação em sede de IRS, defende a ALP.

No entender da ALP, o “mínimo de existência” tem de ser tornado universal, podendo até ao limite de 1,5 x 14 x IAS (Indexante de Apoios Sociais), acumular vários tipos de rendimentos auferidos. Na realidade, em causa estão, sobretudo rendimentos prediais que acumulam com pensões de reforma muito baixas. De acordo com uma simulação realizada pelo Gabinete de Estudos da ALP uma pensão mínima contributiva de 278,05 euros x 14 = 3892,70 + uma renda de um imóvel de 400 euros, totaliza um rendimento global anual de 8692,70 euros anuais – francamente abaixo do “mínimo de existência”. No entanto, este contribuinte terá de suportar uma factura de IRS de €1344 (pela tributação autónoma de 28%) e de 696 euros – taxa de 14,5% IRS se optar por englobamento de rendimentos prediais. É inadmissível a perpetuação desta injustiça fiscal.

– Isenção integral de IRS a todas as rendas “congeladas”, de contratos de arrendamento anteriores a 1990

Esta é mais uma medida de justiça e equidade fiscal que urge aplicar para compensar por via fiscal os proprietários que são forçados há décadas a fio pelo Estado a suportar rendas de valores simbólicos, muito abaixo dos valores de mercado e dos valores praticados nos programas de arrendamento acessível, que têm isenção fiscal integral de IRS.

A ALP recorre a casos concretos de seus associados para ilustrar o absurdo da injustiça fiscal que teimosamente não é corrigida ano após ano, prejudicando quem tem baixos rendimentos e suporta a função social que competia ao Estado. O enquadramento desta injustiça é ainda mais flagrante se comparado com as regras do arrendamento acessível, criado em 2018 pelo Governo Socialista: um imóvel na cidade de Lisboa, com três assoalhadas, um contrato de arrendamento ao abrigo dos programas de arrendamento acessível do Governo, com a duração de cinco anos, e uma renda mensal de 1150 euros, está integralmente isento de IRS; já um imóvel com a mesma tipologia, na mesma cidade, com um contrato vitalício anterior a 1990, e uma renda inferior a 50 euros mensais suporta uma factura de IRS à taxa liberatória de 28%.

De facto, os proprietários com contratos de arrendamento celebrados em data anterior a 1990 estão votados ao esquecimento pelos sucessivos Governos e no universo da ALP representam um quinto do mercado. E ainda que a ALP se congratule com a medida que prevê que arrendamentos celebrados ou vigentes após 2019, com prazo inicial ou prazo de renovação  a partir de dois anos, sejam contemplados com a redução da taxa liberatória de IRS, na realidade esta constitui também um factor de agravamento no sistema “bipolar” que se insiste em manter em matéria de arrendamento, prejudicando sempre os proprietários que são obrigados a suportar rendas antigas congeladas.

 

Urge a correcção desta disfuncionalidade gritante, sobretudo quando o Governo protelou injustificadamente (pela quarta vez) o congelamento de rendas, cujo prazo transitório, ao abrigo do Novo regime de Arrendamento Urbano, de 2012, deveria ter terminado em 2017. Urge levantar esta suspensão de forma a permitir aplicar o previsto na lei, possibilitando a actualização da renda para o cálculo de 1/15 do VPT (Valor Patrimonial Tributário).

– Instituição automática do princípio do “tratamento fiscal mais favorável” em sede de IRS (englobamento versus taxa liberatória de 28%)

Todos os anos, milhares de proprietários, sobretudo os mais idosos, estão a pagar mais IRS do que deveriam, simplesmente porque não têm literacia financeira e digital suficiente.

Em causa está a opção de “englobamento de rendimentos”, que consta do impresso da declaração do IRS, que passa despercebida a muitos proprietários de baixos rendimentos prediais aquando da submissão digital, a partir do Portal das Finanças.

Ao selecionar essa caixa – e apenas se for seleccionada –, os proprietários com rendimentos prediais mais baixos vêem os seus rendimentos tributados a uma taxa de IRS que pode ser inferior (no caso de rendimentos baixos) ou superior (no caso de rendimentos muito altos) à taxa liberatória de 28% de IRS, que incide automaticamente sobre os rendimentos prediais. Se essa opção não for seleccionada, os proprietários podem estar a suportar mais do dobro do IRS que lhes deveria ser cobrado pelo Fisco.

Cabe à Autoridade Tributária, no entender da ALP, abolir esta verdadeira “armadilha” e desenvolver um algoritmo que aplique automaticamente o “tratamento fiscal mais favorável”, bastando criar uma janela de alerta aquando da submissão da declaração de rendimentos, a confirmar que o contribuinte proprietário aceita a opção do englobamento por lhe ser fiscalmente mais favorável. Actualmente, com a digitalização de procedimentos, não há nenhum impedimento para que este “tratamento mais favorável” não seja automaticamente aplicado.

Este princípio do “tratamento fiscal mais favorável” deveria aliás ser sempre aplicado por princípio em todos os impostos sobre o património, que contêm diversas “armadilhas”. Veja-se, a este propósito, a injustiça que existiu nos primeiros anos de vigência do AIMI (Imposto Adicional ao IMI), nomeadamente no que concerne às heranças indivisas, cujos titulares desconheciam a exigência da confirmação informática individual, o que levou ao pagamento de milhares de euros de forma perversa.

Outra alteração a contemplar prende-se com o reporte dos prejuízos fiscais da categoria F do IRS, que devia ser considerado nos anos subsequentes, independentemente da opção ou não pelo englobamento dos rendimentos.

– Prolongamento dos coeficientes de “neutralidade fiscal” anunciados para 2023 nos anos subsequentes

 Os proprietários portugueses ouviram e tentam conformar-se com as palavras do ministro das Finanças quando garantiu publicamente, em conferência de imprensa, que a imposição administrativa de um tecto de 2% à actualização das rendas em 2023 teria total “neutralidade fiscal”. Tal, no entanto, não se veio a verificar, porquanto a compensação pela perda, de acordo com a proposta do Governo, através da aplicação de coeficientes de compensação fiscal, apenas se aplicará aos rendimentos de 2023 (declarados em 2024), forçando os senhorios a esse empréstimo antecipado durante um ano de crise económica e financeira.

Para ilustrar, a ALP recorre a um exemplo de uma renda de 500 euros mensais, que, em 2023, de acordo com o coeficiente apurado pelo INE em Agosto, deveria sofrer um aumento de 5,43% (para 527,15€). Todavia, essa renda apenas poderá ser actualizada em 2% (para 510 euros).

Em 2024 – e isto se o Governo não impuser nova limitação administrativa —, uma actualização de, por exemplo, 2% incidirá sobre o valor de 510 euros (resultando numa renda de 520,20€ mensais), e não sobre os 527,15€, o que resultaria numa renda mensal de 537,69€. Ou seja, os proprietários, neste caso, perdem 17 euros mensais em 2024 devido à limitação administrativa imposta no ano transacto.

A ALP propõe, por isso, a garantia de que a compensação para a perda de rendimentos prediais a que os proprietários foram forçados pelo Estado em 2023, devido à imposição do tecto máximo de 2% na actualização das rendas, se mantenha nos anos subsequentes, através da aplicação de coeficientes de “neutralidade fiscal”, porque só assim ela existirá de facto.

– Garantia de “neutralidade fiscal” aos proprietários que têm despesas dedutíveis com os imóveis arrendados superiores a 4% do respectivo rendimento bruto

Ainda dentro da questão da anunciada “neutralidade fiscal” da medida que impõe um tecto máximo de 2% às actualizações de rendas em 2023, de acordo com as simulações realizadas pelo Gabinete de Estudos da ALP, esta não é atingida no caso dos proprietários que têm imóveis arrendados e cujas despesas dedutíveis (como obras de manutenção e recuperação, condomínio, IMI, entre outras) sejam superiores a 4% do rendimento bruto do proprietário.

Este é um valor de despesas muito baixo, tendo em conta as despesas de manutenção periódica dos imóveis, como por exemplo manutenção de elevadores, contas de água e electricidade das partes comuns. No caso de manutenções ou obras extraordinárias — a reparação de uma cobertura de um prédio ou, por exemplo, a reabilitação integral de um imóvel,  com o aumento dos preços dos materiais e mão de obra da construção civil acima dos 20% em 2022 —, este valor é facilmente superado no âmbito da submissão da declaração de rendimentos em sede de IRS.

Para promover a neutralidade fiscal, e tendo como pano de fundo a reconhecida necessidade de reabilitação urbana das cidades portuguesas, por forma a oferecer habitação condigna para arrendamento e para as classes médias e jovens, a ALP propõe a criação de um quociente de majoração dessas despesas em sede de IRS, para atingir a proclamada “neutralidade fiscal”.

A título de exemplo, um rendimento predial bruto de €3000 mensais, com 10% de despesas declaradas, é penalizado em sede de IRS em €54,43, mesmo aplicando os coeficientes de neutralidade anunciados). Se o valor de despesas ascender a 20% do rendimento do proprietário, o que facilmente ocorre com uma reabilitação de condomínio, por exemplo, ou mesmo em obras executadas no imóvel, o proprietário ficará prejudicado em €145,15 (além das despesas em que se viu obrigado a incorrer).

 

– Mais despesas dedutíveis aos Rendimentos Prediais

Poderá uma habitação ser colocada no mercado de arrendamento sem ter os móveis de cozinha? Naturalmente que não, que tal seria um absurdo, e repare-se que é absolutamente impensável imputar aos inquilinos a compra e montagem destes equipamentos, quer pelo seu valor, quer sob pena do perigo de ocorrência de danos nas canalizações de água e gás. Todavia, essa despesa, de grande monta, não é dedutível em sede de IRS aos rendimentos prediais dos senhorios. Da mesma forma, quaisquer equipamentos essenciais para uma habitação, como um fogão, forno, frigorífico ou exaustor não podem também ser abatidos em sede de IRS.

A ALP alerta para o facto de existir uma causalidade entre o valor da renda a praticar e a não dedução destas despesas em sede de IRS.

O Estado, ao não permitir aos senhorios a dedução, está a aumentar artificialmente o valor de renda a praticar, já que os proprietários terão de repercutir o valor do IRS sobre o custo dos equipamentos, prejudicando assim, em última análise, os próprios arrendatários.

A ALP propõe, por isso, que passe a ser aceite a dedução deste tipo de despesas no IRS dos proprietários de imóveis arrendados.

No caso de contratos de arrendamento a estudantes, onde existe enorme carência de oferta do Estado mas também dos privados, a ALP propõe que as despesas com mobiliário possam também ser dedutíveis em sede de IRS, pois é mandatório a casa estar mobiliada, bem como equipada com electrodomésticos.

Outro item que deverá definitivamente ser introduzido para efeitos fiscais prende-se com as despesas destinadas a ultrapassar o incumprimento dos arrendatários, como consultas jurídicas para instrução de processos de despejo, que têm de passar a ser dedutíveis em sede de IRS.

A ALP propõe igualmente que o seguro de rendas para protecção do senhorio face ao incumprimento do inquilino no pagamento das rendas deva ser dedutível para feito de IRS.

– Mais incentivos à reabilitação urbana

 A reabilitação urbana tem os dias contados, a manter-se esta trajetória de empobrecimento e confisco fiscal dos proprietários.

E a este propósito, confessa o legislador no passado ano de 2019, no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 66/2019 de 21.05, que introduziu alterações ao Regime Jurídico de Obras em Prédios arrendados (RJOPA), previsto no  DL n.º 157/2006 (de 08 de Agosto), que:

“Durante anos, assistiu-se em Portugal a uma progressiva degradação do edificado, em parte consequência das limitações administrativas impostas ao valor das rendas, da pouca capacidade financeira dos proprietários para a realização das obras de conservação necessárias e da falta de apoios financeiros significativos à reabilitação do edificado.”

E conclui que: “Actualmente, com as alterações ao enquadramento legal e fiscal em matéria de arrendamento urbano e de reabilitação urbana e a disponibilidade de um conjunto de instrumentos de financiamento para as obras de reabilitação, designadamente o IFRRU 2020 e o Reabilitar para Arrendar, estão reunidas as condições para que os proprietários cumpram o seu dever legal em matéria de conservação de edifícios e de garantia das condições mínimas de habitabilidade.”

 Não é, no entanto, verdade que estejam reunidas todas as condições para promover a conservação dos edifícios, e a ALP defende que é urgente rever toda a lei do arrendamento que impede a reabilitação do património, porque com o contínuo estrangulamento do Alojamento Local, grande impulsionador da renovação das nossas cidades, pouco tardará para voltarmos ao cenário de degradação que existia no parque habitacional português.

Neste enquadramento, no que respeita às deduções à colecta, há necessidade de rever desde já os montantes que decorrem do n.º 4 do art. 71 .º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, que vêm a limitar em sede de IRS os valores muito desfasados da realidade nacional, pois permitem apenas a dedução à colecta até ao limite de 500 euros, 30% dos encargos suportados pelo proprietário relacionados com a reabilitação de: a) Imóveis localizados em ‘áreas de reabilitação urbana’ e recuperados nos termos das respectivas estratégias de reabilitação; ou b) Imóveis arrendados passíveis de actualização faseada das rendas nos termos dos artigos 27.º e seguintes do Novo Regime de Arrendamento Urbano (NRAU), aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, que sejam objecto de acções de reabilitação.

– Mais apoios para instalação de energias renováveis e medidas de promoção da eficiência energética dos edifícios e imóveis

Portugal não pode perder o comboio do combate às alterações climáticas e não é aceitável que, apesar do clima ameno do sul do país, ainda se morra de frio no nosso país, sobretudo nas zonas rurais e entre a população mais idosa. De acordo com os dados do Eurostat de 2020, Portugal consta como o quinto país da União Europeia onde as pessoas têm menos condições económicas para manter as casas devidamente aquecidas, sendo que cerca de 19% dos portugueses estão em situação de pobreza energética.

A ALP defende, por isso, um reforço de linhas de apoio e comparticipação no âmbito do Fundo Ambiental, a conceder aos proprietários para a instalação de energias renováveis e eficiência energética, nomeadamente no que diz respeito a despesas efectuadas em isolamento térmico de paredes, pavimentos e coberturas, a instalação de janelas eficientes, com vidro duplo e corte térmico, e demais sistemas, como a instalação de painéis solares térmicos.

Recorde-se que o parque habitacional da Europa consome 40% da energia primária do continente e que, por essa razão, constitui a maior fonte – sobretudo indirecta – de emissões de CO2, estando Portugal vinculado às metas comunitárias de redução destas emissões estabelecidas pela Directiva Comunitária EPBD (“Energy Performance in Buildings Directive”).

No actual cenário de escassez energética devido à guerra na Ucrânia, este desígnio da eficiência energética e redução dos consumos é cada vez mais importante. Para as gerações futuras, é essencial a reconversão do parque habitacional, para o tornar mais amigo do ambiente.

  1. Medidas no âmbito do IMI – Imposto Municipal sobre Imóveis

– Redução do IMI: taxa única de 0,2% para todos os municípios

O IMI é um imposto que se repercute anualmente sobre milhões de proprietários de imóveis, e cuja receita reverte a favor das Câmaras Municipais. As taxas de IMI variam actualmente entre um mínimo de 0,3% e um máximo de 0,45% sobre o valor patrimonial tributário dos imóveis urbanos. Acresce que, em 2022, o valor médio de construção por metro quadrado para efeitos do cálculo do Valor Patrimonial Tributário (VPT) sofreu o maior aumento de sempre, fixando-se em 640 euros.

Exige-se por isso um alívio fiscal transversal deste imposto, cuja receita ultrapassou já os 1500 milhões de euros. Há duas décadas, em 2002, a colecta de IMI era de 605 milhões de euros, tendo mais do que duplicado em vinte anos.

No pacote de exigências dos proprietários no âmbito do OE2023, a ALP exige um alívio fiscal do garrote do IMI, defendendo a fixação de uma taxa única de 0,2%, a aplicar em todo o país. Trata-se também de uma medida que aliviaria a asfixia fiscal que atinge anualmente milhões de proprietários e famílias. Recorde-se que mais de 70% dos portugueses são proprietários da sua habitação própria permanente, sendo por isso sujeitos passivos de IMI.

Acresce que a ALP vê com a maior preocupação uma nova actualização em matéria de coeficiente de localização e zonamento, prevista para o ano de 2023, agravando necessariamente o VPT dos imóveis e os valores dos impostos a liquidar pelos contribuintes.

 

– Redução automática de IMI em 30% para todos os imóveis colocados no mercado de arrendamento

Ainda no âmbito da batalha contra a discricionariedade que é praticada pelos municípios em sede de IMI, a ALP reivindica uma redução automática em 30% do valor a pagar por este imposto, no caso de imóveis arrendados.

Tratar-se-ia de uma alteração ao Código do IMI de forma a constituir a possibilidade de redução até 30% da taxa, bem como tornar o mecanismo automático sem necessidade da instrução de qualquer processo, uma vez que apenas algumas câmaras do país o aplicam (por exemplo Lisboa, com o máximo de 20%), e que milhares de proprietários desconhecem, ou não sabem como instruir. Esta medida fomentaria a colocação de imóveis no mercado de arrendamento tradicional, no entender da ALP.

 

 – Compensação da perda de rendimentos imposta aos proprietários que aderiram aos Programas de Arrendamento Acessível do Governo por via de desconto no IMI

São poucos os proprietários que aderiram aos programas de arrendamento acessível do Governo, mas fizeram-no de boa-fé, acreditando que as regras do jogo não seriam alteradas a meio do percurso: nos três anos do PAA, e segundo o Ministério das Infraestruturas e da Habitação, foram submetidos 1033 contratos, dos quais 868 acabaram por ser aprovados (dados de Abril de 2022).

Estes são os proprietários que saem mais prejudicados pela fixação administrativa de um tecto máximo de 2% à actualização das rendas. Isto porque os rendimentos prediais destes senhorios já se encontram isentos de IRS, por estarem a praticar valores 20% abaixo do mercado, valor apurado pela mediana oficial do INE, por freguesia e tipologia de imóvel, regras que estão subjacentes aos programas de arrendamento acessível.

A ALP propõe que a compensação fiscal a estes proprietários seja efectuada em sede de IMI, atribuindo um desconto de 50% no valor a liquidar no IMI em 2023 e nos anos subsequentes.

 

  1. Medidas no âmbito do AIMI – Adicional ao IMI
  • Extinção imediata do AIMI

A ALP defende a imediata extinção do Imposto Adicional ao IMI. Revogar o AIMI no quadro do OE2023 é uma medida que repõe alguma justiça fiscal e normalidade no mercado imobiliário, numa altura em que se assiste a uma escalada sem precedentes dos preços da habitação a par de uma quebra sem precedentes da confiança dos proprietários.

No entender da ALP, esta é uma taxa puramente ideológica que permitiu um encaixe fiscal marginal nos cofres do Estado, que nunca chegou a centena e meia de milhões de euros desde que foi criado, em 2017, por proposta do Bloco de Esquerda, aquando do Governo da “geringonça”. Analisando os dados de 2021, a receita de AIMI caiu 6,6% face a 2017. Os efeitos nefastos que criou no mercado superam muito as receitas arrecadadas.

Relembre-se que o AIMI significou um aumento marginal de impostos sobre o património imobiliário, incidindo exclusivamente sobre os imóveis habitacionais e terrenos para construção. O imposto resultou num aumento transversal dos preços da habitação no mercado de compra e venda e também no arrendamento.

 

  1. Medidas no âmbito do IMT – Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas e do Imposto de Selo

– Aumento das isenções a conceder em sede de IMT. Extinção do Imposto de Selo

A ALP defende que é necessário aumentar as isenções em sede de IMT e abolir o Imposto de Selo na compra de imóveis. Estes são impostos injustos e cegos que constituem um dos principais factores impeditivos da compra de habitação própria permanente para os portugueses e essencialmente para famílias mais jovens.

Actualmente há isenção de pagamento de IMT quando está em causa a compra de casa destinada a habitação própria e permanente até aos 93.331 euros, um valor que é manifestamente irrisório para os valores de mercado e nos grandes centros urbanos. É preciso, no entender da ALP, mais do que duplicar o valor desta isenção, ir até aos 200.000 euros, não bastando a proposta de actualização em 4% apresentada em sede Orçamento de Estado.

O Estado está sentado sobre milhões de euros de receitas provenientes do imobiliário e da compra de casa, sem nada fazer para apoiar os mais jovens e aqueles que menos recursos têm a conseguir ter acesso a uma solução de habitação condigna.

Os números da receita de IMT são autoexplicativos: em 2021, o IMT atingiu um recorde de receita de 1.354,5 milhões de euros, aumentando 371,3 milhões em relação a 2020. O IMT ultrapassou pela primeira vez a barreira dos mil milhões de euros de receita em 2018 (1.003,9 milhões de euros), fasquia que conseguiu manter em 2019.

 

  1. Outras medidas de emergência a adoptar em 2023, para reverter a crise habitacional do país

– Associações de Proprietários e Inquilinos com assento no Conselho Económico e Social

Os proprietários de imóveis arrendados assumem um inegável papel social, e são garante do Direito Constitucional à Habitação para praticamente um milhão de famílias. Representando uma fatia de mais de um quinto de toda a oferta habitacional do país, é fundamental que as associações de proprietários e de inquilinos tenham assento no Conselho Económico e Social (CES). Recorde-se que o CES é o órgão de consulta e concertação no domínio das políticas económica e social, previsto no artigo 95.º da Constituição, que participa na elaboração dos planos de desenvolvimento económico e social do país.

 

– Reactivação da Comissão de Acompanhamento do Mercado de Arrendamento Urbano

Todos os agentes do mercado imobiliário — proprietários, inquilinos, promotores e investidores — e a própria tutela da Habitação se queixam da falta de informação oficial e estatística sobre a evolução do mercado de arrendamento português.

De facto, a falta de rigor neste domínio ficou patente quando o Governo justificou a prorrogação do congelamento das rendas, no passado mês de Janeiro, no âmbito do OE2022, para poder estudar o fenómeno que persiste há mais de 110 anos através de novos estudos. Este desconhecimento é tanto mais incompreensível quando todo o processo de submissão de novos contratos, emissão de recibos e declaração anual de rendimentos é totalmente informatizada junto da Autoridade Tributária.

Para a ALP, urge reactivar em 2023 a Comissão de Monitorização do Mercado de Arrendamento, e assim criar um canal de monitorização do mercado de arrendamento transparente e acessível a todos, transformando esta comissão num fórum de partilha e diálogo periódico, essencial para enfrentar com seriedade e rigor  os problemas estruturais do arrendamento português, bem como para dar início a uma reforma total na lei do arrendamento que a cada ano se emaranha  mais, sendo uma fonte de litígios constante.

Recorde-se que a Comissão de Monitorização da Reforma do Arrendamento foi criada em 2012 e reuniu durante cerca de um ano, tendo apresentado três relatórios trimestrais da maior relevância. A Comissão de Monitorização era composta pelas Associações de Proprietários (entre as quais a ALP), pelas estruturas associativas de Inquilinos, pela estrutura representativa de Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária; pela Associação Nacional de Municípios Portugueses; pelo Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana; pelo Instituto da Segurança Social; pela Autoridade Tributária e Aduaneira; pela Direcção Geral da Administração da Justiça; pela Confederação do Comércio e Serviços de Portugal; e pela Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal.

 

– Segurança Social a construir e gerir património imobiliário

Recorda o livro “100 anos de Políticas Públicas de Habitação”, editado em 2018 pelo IHRU, que terá sido a aguda crise de emprego em Portugal, consequência da Primeira Grande Guerra, que forçou o governo de Sidónio Pais a assinar a 24 de abril de 1918 o primeiro instrumento legislativo especificamente dedicado ao incentivo da construção de «Casas Económicas». Ofereciam-se então vantagens (fiscais e outras) aos particulares, cooperativas, «sociedades anónimas de habitações económicas», associações de socorros mútuos, instituições de assistência ou previdência, câmaras municipais e instituições do Estado que tomassem a iniciativa da realização de conjuntos habitacionais sob bem definidas condições de salubridade.

Em sentido semelhante, no contexto do pós-Segunda Guerra Mundial, apontou também o Governo, em 1945, para a criação do regime de «Casas de Renda Económica», alargando significativamente o leque de potenciais intervenientes na promoção pública de habitação (cooperativas, organizações corporativas ou de coordenação económica, instituições de previdência social, empresas concessionárias de serviços públicos, indústrias e privados) e de potenciais arrendatários (estratos médios e médios-baixos, não abrangidos pelos programas existentes). Ter-se-á assim procurado dar um impulso decisivo às políticas de arrendamento social, assentes na premissa da propriedade pública do parque habitacional; o modelo de propriedade tendencialmente privada perdeu a predominância que só voltaria a ganhar na década de 1980.

Mais de cem anos depois do primeiro impulso de políticas públicas de habitação e num quadro de guerra na Europa, urge que a segurança social volte a construir património imobiliário. Este investimento é um investimento seguro, se bem gerido, e pode capitalizar o Fundo de Estabilização da Segurança Social, tão deficitário devido à crise demográfica que o país atravessa.

 

– Arrendamento Acessível – Utilização da Média de Rendas apurada pelo INE ao invés da Mediana

Os valores máximos das rendas a praticar no âmbito dos programas de arrendamento acessível do Governo ou das autarquias nacionais têm de ser, nos termos da lei, inferiores em 20% aos valores medianos apurados pelo INE. A opção de utilizar a mediana do INE não encontra precedentes em mais nenhum indicador publicado pelo INE, e mereceu desde 2019 a frontal oposição da ALP, já que a média é influenciada por todos os valores da amostra de rendas do país, enquanto que a mediana é o valor central desse universo, excluindo os valores mais altos e os mais baixos. Dessa forma, em termos estatísticos, a mediana é cerca de 20% a 30% mais baixa do que a média apurada.

Numa altura em que se prejudicaram os proprietários que apostaram no arrendamento acessível, seria da mais elementar justiça passar a utilizar a média dos arrendamentos apurada pelo INE, mantendo inalterados os benefícios fiscais a atribuir aos proprietários que adiram a estes programas.

 

 

O tempo escasseia. O Orçamento do Estado, sem amarras ideológicas e com um cenário de excedente orçamental e de crescimento económico como pano de fundo às portas de 2023, é o momento de excelência para o Governo dar um sinal inequívoco da sua vontade de mudar um paradigma que falhou, que vai continuar a falhar.

Insistir no erro é prejudicar deliberadamente gerações de portugueses de ambos os lados do mercado — senhorios e arrendatários.

Este é o momento da coragem de encontrar, em conjunto, com transparência, diálogo e sobretudo ambição, soluções para o mercado de habitação e arrendamento.

 

 

A Direcção da ALP